quarta-feira, 16 de fevereiro de 2011

“Quero ser policial que nem você”

A tropa de elite de mulheres na posse






Para quem ainda acredita que nada vai mudar no papel dos gêneros na sociedade apesar da eleição inédita de uma mulher a presidência da República, uma informação: as transformações são reais e ficarão evidentes de uma forma simbólica na posse do dia 1º, em Brasília.

À frente do Rolls Royce onde estará Dilma Rousseff, seis batedoras da Polícia Rodoviária Federal, escolhidas pela experiência e habilidade, terão a honra de ser o abre-alas oficial do desfile presidencial pela Esplanada dos Ministérios.

A opção de motociclistas mulheres foi feita pela Polícia Rodoviária Federal como uma homenagem à presidente. “É uma forma de despertar o interesse das pessoas e mostrar que mulher também sabe e pode fazer essa função sempre vista como masculina”, diz o inspetor Heleno, um sujeito simpático, com 28 anos de motociclismo, encarregado de treinar moças e rapazes interessados nessa divisão especial. 

Chefe do núcleo de motociclismo da PRF, tem fama de não aliviar no treinamento delas e acrescenta um dado interessante sobre a participação das mulheres. “Elas pegam mais rápido minúcias do treinamento, mostram-se sempre habilidosas”.

Os policiais motociclistas dirigem uma Harley-Davidson de 1780 cilindradas, uma indicação de alta potência do motor capaz de desenvolver 220 km/h. 

A máquina pesa 325 kg. Se tombar, nem homem levanta. Só com ajuda. O treinamento requer habilidade para manter o equilíbrio em baixa velocidade – algo muito mais difícil do que correr –, andar na chuva sem derrapar e saber cair. 

Já pensou 325 kg em cima da perna? Pois é. Não é à toa que esse é o momento mais tenso do curso.

De uniforme operacional, capacete, coldre com arma numa coxa, carregadores na outra, elas também levam na discreta bolsinha preta atada ao cinto batom, protetor solar, absorvente e usam, sim, o retrovisor para retocar a maquiagem quando estão paradas. Por que não?

Dona de um par de reluzentes olhos verdes, Angélica, 39 anos, já participou da escolta de autoridades estrangeiras de algum país árabe do qual não se recorda o nome. Ouviu, como as demais, não cantadas, mas questionamentos surpresos dos visitantes sobre a capacidade das moças de garantir-lhes a segurança no trânsito.

Quando entrou para a PRF, há 15 anos, a policial Ana Maria de Mello (a última, ao fundo, na foto), 46 anos, que estará no comando das batedoras na posse, era uma exceção. Era a única mulher na escolta do presidente Fernando Henrique, por exemplo. Com um sorriso enigmático, ela parece voltar no tempo antes de dizer “…foi difícil, viu?”.



As mulheres representam apenas 8% dos motociclistas da PRF, mas já conquistaram, entre outros direitos mais relevantes, o de deixar aparecer o cabelo por baixo do capacete. Rindo, Ana Maria comenta: “ah, foi uma conquista bonita, porque antes tinha que fazer coque, aí parecia que era tudo homem, né, porque de capacete e uniforme igual…”, diz.

 Casada e mãe de quatro, Ana Maria é do time das avós (tem duas netas) junto com outra batedora do grupo, Leila, 46 anos, 3 filhos, um neto. Duas Márcias e Suzana completam o seleto time de mulheres que cuidam de si, da família, malham pernas e braços para agüentar o peso da moto e o tranco da vida de policial rodoviária. Elas multam, protegem, policiam as estradas e ainda param o trânsito. Não é para qualquer um.



Na tarde chuvosa da última quinta-feira, seis agentes femininas estavam na Academia da PF, nos arredores de Brasília, prontas para mais um treinamento da cerimônia de posse. 

Elas farão a segurança aproximada do carro presidencial, acompanhando o cortejo a pé, conforme a velocidade do Rolls Royce, num percurso de aproximadamente 1,3 km. Esse time, treinado em defesa pessoal, tiro, investigação, imobilização, entre outras qualificações, é o mesmo que fez a segurança de Dilma Rousseff durante a campanha e, a pedido da presidente eleita, foi mantido para a posse.

As moças, cujas idades variam de 30 a 47 anos, caíram nas graças da nova mandatária do país pela competência e seriedade. Avessas à exposição pessoal, agora sabem que não tem jeito.

 Viraram alvo de reportagens e já são até paradas na rua, numa demonstração prática, ainda que não científica, da influência que a eleição de Dilma - e o consequente destaque dado a mulheres em várias profissões - pode exercer no debate sobre o papel de homens e mulheres na sociedade.




Reconhecida por uma adolescente num shopping de Brasília, a policial federal Jane, de 46 anos (a segunda, da esquerda para a direita), ouviu o que achou um comentário ilustrativo, além de bem legal, sobre as mudanças comportamentais que vêm por aí. 

“Quero ser policial que nem você”.


Jane é uma mulher tipo mignon. Com 1m67 e um corpo esguio, segurou muito marmanjo impertinente durante a campanha de Dilma Rousseff. 

Ela é instrutora de tiro, de sobrevivência na selva e na caatinga. Faixa preta de karatê e mãe de dois filhos, além de fluente em três línguas, a pernambucana conquistou a confiança da presidente eleita e arrebatou o coração do agente Sílvio, na mesma missão iniciada em julho com a campanha. Quando Jane saiu para se juntar aos colegas no treinamento, Sílvio ficou observando de longe.


Ciente do currículo da policial, comento com ele: 

“Ela é danada, hein”.

“É linda e é a mulher que eu amo”.


(Fotos: Fabio Rodrigues Pozzebom/ABr e Adriano Machado)

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